Pós-pandemia: o mundo mudará?

Por Aldo Paviani, geógrafo e professor emérito da UnB, para o Correio Braziliense em 01/06/2020

 

A mídia noticia, diariamente, o que se passa no mundo. Sabe-se o que ocorre, sobretudo as tragédias, as angústias, os medos, os êxitos e as esperanças. O que mais se lê e escuta, repetidamente, é que o mundo não será mais o mesmo. A pandemia trará mudanças em todos os quadrantes geográficos por onde o vírus circulou. A covid-19 provocará alterações nos comportamentos individuais e coletivos em razão de que o isolamento social propiciou reflexões profundas em todos. As pessoas observaram que, por onde grassou a pandemia, deixou rastros de luto, tristeza e temores.

Daí a necessidade de quarentena e de encerramento das atividades comerciais, industriais e de serviços. As escolas fecharam e os estudantes passaram a ter aulas virtuais. O mundo encolheu. Esse quadro indica posições em que a mortandade em ascensão impulsionou quietude, silêncio nas ruas, raros automóveis circulando, os aviões não cruzam os céus e a navegação costeira cessou – tudo para que os meios de transporte não fossem vetores da calamidade generalizada nunca antes acontecida no planeta.

Antes, os tempos eram tidos como normais, mas o ar era irrespirável em razão da poluição atmosférica. O uso de máscaras faciais nas ruas, por isso, era obrigatório para a proteção das pessoas. Com a pandemia, a máscara se tornou vital como anteparo ao vírus mortal. Com a calmaria, o mar apresenta água transparente, com vida marinha exuberante. As praias, convidativas, animam banhistas e mergulhadores à prática de esportes aquáticos – todavia, proibidos. O silêncio imperou nos estádios brasileiros; nada de bola rolando e torcedores em frenética torcida pelo time de preferência.

Portanto, para se safar da enfermidade, o isolamento social apresentou a média de 40% ou 50% de quarentena nos centros urbanos. Esse comportamento seria maior, não fossem serviços essenciais, como dos hospitais, que vivem sob pressão dos enfermos que chegam a toda hora. Atuam sem parar os serviços de limpeza urbana e coleta de lixo, evitando maior risco à saúde pública. Com isso, os lixeiros passaram a ter maior importância, antes não evidente. As funerárias, os coveiros, os fabricantes de caixões, todos em atividade sem precedentes na história recente. Despontam para essas atividades lucros certos com a ocorrência da tragédia.

Há, também, serviços que nos mantêm informados: dia e noite, sabe-se qual é o roteiro e os percursos geográficos da covid-19. Com os eventos, a imprensa assume papel importantíssimo. Jornalistas vivem tempos agitados nas redações. Constantemente, informam o gradual retorno às atividades econômicas por parte de países em que a infecção e a mortalidade decaíram. As atividades econômicas pressionam, indicando forte demanda dos consumidores.

Consideram que desejam recuperar as perdas acumuladas por quase 90 dias de paralisação. O comércio e a indústria pressionam para abertura total das atividades, pois desejam recuperar os ganhos perdidos e chamar os trabalhadores desmobilizados com a quarentena. Sem trabalhar, as pessoas vivem pesadamente a crise financeira, chegando ao patamar da fome, na posição mais baixa da pirâmide social.

Portanto, trata-se de retorno. Todavia, será a volta ao que tínhamos previamente? A essa questão se agrega: o mundo mudará? Haverá outra atitude frente ao acontecido? As milhares de mortes ocorridas? Aprendemos as lições do isolamento social? As pessoas recuperarão o trabalho e os salários de antes da pandemia? Há esperanças?

São indagações difíceis de responder, mesmo porque não há bola de cristal para prever um futuro que ainda parece bastante nebuloso. Incerto, também, porque o planejamento nunca foi o forte de certas economias. As mais liberais desejam ter os caminhos livres, sem amarras exigidas por metas e volumes de atividades traçados.

Na atualidade, só há incertezas. Não se fez balanço dos prejuízos humanos e financeiros. Portanto, o dia de amanhã é imprevisível. Será recomendável avaliar os acontecimentos, mesmo sabendo que não se tem ideia do que acontecerá no dia seguinte. A surpresa de ontem virá em dose dupla, hoje ou amanhã. E será assim porque a pandemia virou o mundo de cabeça para baixo.

Importa que os políticos sejam capazes de olhar para o bem-estar da população, ou o tumulto se instalará. Há necessidade de políticas públicas para preservar o meio ambiente (inteiro), pois é na natureza que estarão todas as possibilidades de sobrevivência do planeta. A pandemia colocou o dedo na ferida. Que se aprenda com o sinal de alerta.

 

 

 

 

 

 

Photo credit: Angélica de Castro on VisualHunt.com / CC BY-NC-SA

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