A educação e a soberania

Entrevista com o professor Isaac Roitman pela revista Conceito Jurídico, disponível na página 6 da edição n.37, ano IV, Janeiro de 2020

 

A Revista Conceito Jurídico inicia o ano de 2020, entrevistando o Professor emérito da Universidade de Brasília, pesquisador emérito do CNPq, membro da AcademiaBrasileira de Ciências e membro do Movimento 2022 O Brasil que queremos, Isaac Roitman. E com perfeita maestria, o Professor analisa a nossa Educação e a nossa soberania. “É preciso colocar de forma permanente as inovações educacionais para que tenhamos um País soberano com oportunidades para todos e para todas”. Confira!

 

CONCEITO JURÍDICO O que o Sr. pode nos falar sobre a história do nosso País com relação a nossa soberania, e se de fato somo um país soberano?

 

ISAAC ROITMAN – Durante séculos o Brasil foi uma colônia de Portugal. A nossa independência se perdeu na retórica. O período colonial, iniciou-se em 1532 quando Martim Afonso de Souza fundou o primeiro núcleo de povoamento, a Vila de São Vicente. Esse período durou até 1822. Em 1534 foram criadas 15 capitanias hereditárias que foram doadas para uma pequena nobreza lusitana. A economia predatória foi praticada em todo período colonial abrangendo vários ciclos: pau brasil, cana de açúcar, ouro e diamante, e outros. A colonização teve como principais

características: civilizar, exterminar, explorar, povoar, conquistar e dominar. A “suposta” independência do Brasil aconteceu em 1822 tendo como marco o “grito do Ipiranga” inaugurando a monarquia com a coroação de Dom Pedro I. Em vários aspectos (econômico, cultural, etc.) somos ainda um país colonizado e ainda longe de sermos um país completamente democrático.

 

CONCEITO JURÍDICO – Se “somos ainda um país colonizado e ainda longe de sermos um país completamente democrático”, o que o Sr. tem a nos dizer sobre a nossa independência e soberania?

 

ISAAC ROITMAN – Em 2022 vamos comemorar 200 anos de nossa independência. Não dá para dizer que um país é independente quando parte de seu povo depende de uma “bolsa família” para sua subsistência. Existe independência quando mais da metade de seu orçamento é utilizado para amortizar a dívida pública. Que independência é essa quando a política é um plano de carreira, não um trabalho

social e onde medidas superficiais são adotadas para combater a desigualdade social. Não podemos falar em independência e soberania quando nossas terras e empresas são adquiridas pelo capital internacional. Não dá para dizer que somos independentes quando a tsunami da corrupção assola o país. Não dá para dizer que somos independentes quando as políticas de educação e cultura são praticamente

inexistentes.

 

CONCEITO JURÍDICO – O que caracteriza um país justo, moderno e independente?

 

ISAAC ROITMAN – O que caracteriza um país justo, moderno, independente é aquele que oferece boa qualidade de vida à população. É aquele que desenvolve uma agropecuária moderna e autossustentável, estrutura industrial competitiva, desenvolvimento científico e tecnológico avançado, eficientes meios de transportes, comunicação ampla e democrática, analfabetismo zero, baixa mortalidade, boas condições de moradia infantil, uma eficiente rede de saúde pública, com hospitais bem equipados, sem moradores de rua, boas condições de moradia, alimentação e saneamento básico, segurança pública eficiente e elevada expectativa de vida.

 

CONCEITO JURÍDICO – A educação é a solução?

 

ISAAC ROITMAN – É importante lembrar o pensamento do educador Mozart Neves Ramos (Instituto Ayrton Senna): “Não existe melhor caminho para alavancar a produtividade do que a oferta de uma educação de qualidade. Isto significa prover uma educação que seja capaz não apenas de preparar bem os nossos jovens para o

exercício de uma profissão, mas também de prepará-los plenamente para o exercício da cidadania”. Precisamos mudar o mantra de “melhorar” a educação pelo mantra de “mudar” a educação. Precisamos substituir o paradigma de “instrução” pelo da “aprendizagem”. É preciso responder adequadamente à pergunta feita por Yuval Harari: “Nossas atividades educativas estão sintonizadas com as mudanças

que estão vindo, em especial agora que a sociedade está ficando mais interativa e com a inteligência artificial que vai encarregar de muitas das tarefas que foram executadas por nós”? É importante refletir sobre o pensamento do educador português José Pacheco (criador da Escola da Ponte em Portugal) que diz: “Uma educação e uma escola do futuro não poderão deixar de ser novas construções sociaisde aprendizagem. Propostas teóricas e práticas, que estejam fundadas no paradigma da instrução não se constituem em inovação. Por essa razão, será preciso

estar atento a meras sofisticações do discurso pedagógico e distinguir inovação de paliativo do modelo instrucional. Por exemplo: nas escolas do futuro, não haverá salas de aula”.

 

CONCEITO JURÍDICO – Qual a mensagem o Sr. deixa para nossos leitores?

 

ISAAC ROITMAN – É importante deixar a educação de ser tema de discursos de candidatos ou aventureiros demagógicos. É preciso colocar de forma permanente as inovações educacionais para que tenhamos um País soberano com oportunidades para todos e para todas. Vamos conquistar a nossa soberania. Vamos escolher a educação como o melhor caminho.

 

 

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