*Isaac Roitman, para a Revista Ciência e Cultura –
RESUMO
O autor deste artigo participou ativamente da SBPC em diferentes momentos da sua trajetória, como membro da diretoria e do conselho da entidade e como secretário regional da SBPC no Distrito Federal. No texto foi ressaltada a sua atuação, quando membro da diretoria, como representante no Movimento pela Ética na Política (1992); quando membro do conselho (2008), como coordenador do grupo de trabalho de educação e a implantação do Pacto pela Educação. Ainda foi destacada, como marco importante para a entidade, a introdução da SBPC Jovem nas reuniões anuais da SBPC e a sua importância na divulgação e na educação científica.
DESTAQUES HISTÓRICOS
Três anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em um contexto que seria importante incentivar a ciência para promover o desenvolvimento social e econômico, um grupo de cientistas, no dia 08 de julho de 1948, criou em São Paulo a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Essa iniciativa estimulou a institucionalização da ciência no Brasil e inspirou a criação, em 1951, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (Capes), sob a liderança, respectivamente, do almirante Álvaro Alberto e de Anísio Teixeira.
Nesses 70 anos de existência, a SBPC desempenhou um papel importante no desenvolvimento e na história do Brasil, destacando-se como um espaço de resistência e diálogo durante o regime militar (1964-1984). Também foi importante a atuação da entidade no Movimento pela Ética na Política, em 1992. Na década de 1980, com o objetivo de fortalecer os canais de comunicação entre a comunidade científica e a sociedade, a SBPC lançou a revista Ciência Hoje (1982) e o Jornal da Ciência (1987), que se somaram à revista Ciência & Cultura (1949). Outro papel relevante da entidade foi o estímulo à criação das fundações de amparo à pesquisa (Faps) na maioria dos estados brasileiros.
Destaco também a importância das reuniões anuais da SBPC, que acontecem desde 1949. Nos eventos, que são itinerantes, se oferece um espaço de reflexão e debates para analisar os problemas brasileiros e a busca de caminhos para a conquista de um país melhor e mais justo. Explorando os registros de minhas memórias, compartilho com os leitores algumas experiências vividas nessa agora septuagenária instituição.
A EXPERIÊNCIA NA DIRETORIA DA SBPC: O MOVIMENTO PELA ÉTICA NA POLÍTICA
Ocupei o cargo de segundo tesoureiro na diretoria da SBPC no período de 1991 a 1993, quando Ennio Candotti ocupou a presidência. Nesse período, tive o privilégio de conviver com notáveis membros daquela diretoria: além de Candotti, Gilberto Cardoso Alves Velho, Eliane Elisa de Souza Azevedo, João Evangelista Steiner, Abílio Afonso Baeta Neves, Dértia Villalda Freire-Maia, Augusto Brazil Esteves Sant\’Anna e Silvio Roberto de Azevedo Salinas. Durante esse período eu me deslocava de Brasília para São Paulo mensalmente para atender as reuniões da diretoria que eram realizadas em uma casa antiga no bairro de Pinheiros, então sede da SBPC.
Em 1992, surgiu no Rio de Janeiro o Movimento pela Ética na Política – cujo sucesso, no seu início, era desacreditado tanto pelo universo político como pela mídia. Aos poucos, no entanto, várias entidades se agregaram ao Movimento, entre elas, a SBPC, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), a Central Única de Trabalhadores (CUT), a Andes-Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Fui designado para representar a SBPC nas reuniões do Movimento, que eram realizadas em Brasília. A maioria das reuniões acontecia na sede nacional da OAB e eram coordenadas pelo presidente da entidade, o advogado Marcello Lavenére. O Movimento crescia. Em determinada ocasião, cheguei mais cedo para uma das reuniões da diretoria da SBPC em São Paulo e, enquanto aguardava o início do encontro, conversava com o saudoso antropólogo Gilberto Velho, então vice-presidente da entidade, que morava no Rio de Janeiro e também estava adiantado. A certa altura ele expressou que deveríamos, na esfera do Movimento, propor o impeachment do presidente Fernando Collor. Eu argumentei que talvez não fosse o momento exato para isso. Horas depois ele fez a proposta para a diretoria e ela foi aprovada. No dia seguinte, a grande imprensa noticiava nas primeiras páginas: \”SBPC propõe impeachment do presidente Collor\”.
Voltei para Brasília e logo recebi um telefonema do Marcello Lavenére, que disse: – A SBPC propôs mesmo o impeachment do presidente? A proposta não é muito ousada? Eu expliquei o que aconteceu. Dei conhecimento de minha posição. Disse que fui voto vencido, mas que com a decisão da diretoria eu não poderia ter outra posição a não ser apoiar a iniciativa. A proposta ganhou adeptos e foi incorporada ao Movimento. Em 09 de maio de 1992, ficou decidida a realização de uma \”vigília pela ética na política\” que reuniu, no auditório Petrônio Portela do Senado Federal, 183 entidades, 70 parlamentares e mais de mil pessoas. No evento, foi lida a \”Declaração ao Povo do Movimento pela Ética na Política\”, subscrita pelas seguintes entidades: OAB, CNBB, ABI, SBPC, Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE), Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Comissão de Justiça e Paz (CJP), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), conforme transcrita abaixo:
\”Na condição de integrantes da sociedade civil brasileira são também responsáveis pela construção da democracia como instrumento de superação dos graves problemas sociais. Diante da gravidade dos fatos denunciados e que preocupam a todo país, afirmam a sua convicção de que a aplicação da lei a todos igualmente é o remédio contra a impunidade que revolta a nação e contra o descrédito das instituições. A apuração da verdade sem restrições se constitui em clamor de todo o povo brasileiro. Ao contrário das visões alarmistas, as instituições democráticas se fortalecem quando postas à prova, demonstram sua real eficácia independente de dificuldades conjunturais. É imperioso que toda a sociedade civil se mobilize nesse momento colocando-se em estado de vigília permanente para acompanhar as investigações garantindo apoio aos que querem a verdade e denunciando os que pretendem falseá-la.\”
Interessante observar que, passados todos esses anos, o teor da carta é atual no contexto político e social brasileiros dos dias de hoje.
Em 1 de setembro de 1992, em meio a uma onda de manifestações por todo o país, os presidentes da ABI, Barbosa Lima Sobrinho, e da OAB, Marcello Lavenére apresentaram à Câmara o pedido de impeachment de Collor. E deu no que deu. Um fato pitoresco que me vem à mente foi a convocação dos membros do Movimento para assistir, na sede nacional da OAB, ao depoimento em cadeia nacional do presidente Fernando Collor. Após o depoimento, seria realizada uma cobertura da imprensa. Atendi à convocação e convidei o saudoso professor Luiz Gouveia Labouriau, que era membro do conselho da SBPC, para me acompanhar. Após o pronunciamento do presidente, alguém da Rede Bandeirantes de Televisão gritou: – Quem representa a SBPC? Eu imediatamente apontei para o professor Labouriau. O repórter então perguntou: – Qual sua opinião sobre o pronunciamento? O professor Labouriau deu uma resposta sintética: – Muita retórica e pouco conteúdo.
Como a cobertura era ao vivo, na pressa a legenda da reportagem saiu: \”Professor Luiz Gouveia Labouriau, presidente da SBPC\”. Quando cheguei em casa, o telefone tocou. Era o Ennio Candotti, que assistiu o evento pela TV e perguntou: – O que é isso, Labouriau, presidente da SBPC? E eu repliquei: – Você não sabia? Você foi deposto! Sempre há espaço para uma pitada de humor.
A EXPERIÊNCIA NO CONSELHO DA SBPC: PACTO PELA EDUCAÇÃO
Em 2008, eu era membro do conselho da SBPC. Na reunião desse colegiado, realizada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), me manifestei sobre a importância da atuação da entidade no enfretamento dos desafios para conquistarmos uma educação de qualidade em todos os níveis, para todos os brasileiros. O conselho então resolveu criar um grupo de trabalho (GT) de educação e eu fui designado seu coordenador. Em agosto do mesmo ano, o GT propôs a criação de um movimento que foi denominado Pacto pela Educação. Participavam também Carlos Jamil Cury, Ennio Candotti, Daniel Cara, Elisangela Lizardo, João Ferreira da Silva, Lisbeth Cordani, Luiz Carlos Menezes, Luiz Davidovich, Manuel Marcos Formiga, Mozart Neves Ramos e Nelson Maculan.
Em 13 de novembro de 2009, o movimento foi lançado em cerimônia realizada no auditório da reitoria da Universidade de Brasília (UnB), com a presença do então presidente da SBPC, Marco Antônio Raupp, e teve como palestrante o senador Cristovam Buarque. O tema de sua fala foi: \”Como a educação pode mudar o Brasil\”. O Pacto pela Educação, além de propor um projeto de longo prazo, estabeleceria também estratégias para evitar a descontinuidade de sua execução. O fundamento principal seria a pressão social exercida por vários setores da sociedade, com o objetivo de alcançar a qualidade na educação em todos os níveis para todos os jovens brasileiros. Participaram como entidades parceiras a União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes), a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), a Confederação Nacional de Trabalhadores da Educação (CNTE), o movimento Todos Pela Educação (TPE) e a Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE). O GT de educação reuniu-se periodicamente nas reuniões anuais da SBPC até a sua desativação, em 2012. Destaco uma reunião que considero histórica, realizada na Rua Maria Antônia (sede nacional da SBPC), em São Paulo, no âmbito do GT de educação, entre os dirigentes da SBPC com os presidentes da UNE, Ubes e ANPG.
Por motivos que nunca cheguei a entender o GT de educação foi extinto no final de 2012, por decisão da diretoria da SBPC. O argumento era que iriam ser criados GTs específicos para o ensino básico, ensino de graduação e ensino de pós-graduação. Considero pertinente, devido às conjunturas atuais, em que a educação de qualidade ainda não foi conquistada, recriar esse GT, já que tudo aponta que a educação é o melhor caminho para a solução de nossos problemas. Um passo nesse sentido foi dado recentemente, com os seminários temáticos que a SBPC está organizando na série \”Políticas públicas para o Brasil que queremos\”, como parte das atividades de comemoração de seus 70 anos, que engloba eventos sobre a educação básica, a graduação e a pós-graduação.
A SBPC JOVEM: DIVULGAÇÃO E EDUCAÇÃO CIENTÍFICA
Nas reuniões anuais da SBPC realizadas até 1992, o público era majoritariamente composto por cientistas e estudantes de pós-graduação. A partir de 1993, na 45ª reunião anual, realizada na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), os jovens começaram a frequentar as reuniões anuais pela introdução da SBPC Jovem, que reúne uma série de atividades voltadas aos estudantes do ensino básico. O principal objetivo é promover o contato das crianças e dos jovens com o conhecimento científico e com os pesquisadores, para despertar o interesse pela ciência, pela tecnologia e pela inovação. Ela procura promover atividades que estimulem o desenvolvimento da criatividade e da capacidade inventiva e investigativa nos jovens, despertando vocações, e busca incentivar a pesquisa nas escolas. Nesse evento, são realizadas atividades interativas, montadas a partir de propostas selecionadas por meio de chamada dirigida para as universidades federais e estaduais, institutos e centros de pesquisas, fundações de apoio à pesquisa, secretarias de educação, entre outras instituições. Nesse cenário, são montados estandes, exposições interativas, debates, conferências, visitas mediadas, caminhadas ecológicas, feiras de ciência, oficinas, além da presença de centros de ciências itinerantes. As crianças e os jovens têm a oportunidade de acompanhar a Jornada Nacional de Iniciação Científica, que também faz parte da programação das reuniões anuais. Muitas crianças e jovens são acompanhados pelas famílias e professores. Assim, essas atividades são importantes instrumentos para a divulgação científica e para a educação científica (ensino de ciências).
Apesar de inúmeras iniciativas conduzidas por sociedades científicas, pela SBPC e outras entidades, a divulgação científica brasileira deixa a desejar. É extremamente importante que a sociedade saiba o que é ciência e como ela pode ser um instrumento poderoso para melhorar a qualidade de vida de todos. Nesse contexto, as reuniões anuais e as reuniões regionais da SBPC constituem pilares importantes na divulgação científica brasileira. O entendimento, por parte da sociedade, da importância da ciência e da tecnologia é uma dimensão fundamental para a sociedade apoiar e incentivar o desenvolvimento científico e tecnológico no país.
Uma outra iniciativa importante na divulgação científica no Brasil foi a introdução, em 2004, da Semana Nacional da Ciência e Tecnologia (SNCT). Uma iniciativa do então Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) coordenada pela Secretaria de Inclusão Social – sob o comando de Ildeu de Castro Moreira, atual presidente da SBPC -, por meio do Departamento de Popularização e Divulgação da Ciência (DPDI/Secis/MCTI). O evento, realizado no mês de outubro a cada ano, conta com a colaboração de secretarias estaduais e municipais, agências de fomento, espaços científico-culturais, instituições de ensino e pesquisa, sociedades científicas, escolas, órgãos governamentais, empresas de base tecnológica e entidades da sociedade civil. A SNCT tem como principal objetivo aproximar a ciência e a tecnologia da população por meios inovadores, que estimulem a curiosidade e motivem a população a discutir as implicações sociais da ciência, além de aprofundarem seus conhecimentos sobre o tema.
A educação científica, a alfabetização das letras e dos números compõem os três pilares de uma educação de qualidade. A ciência é o melhor caminho para se entender o mundo e o conhecimento científico é o capital mais importante do mundo civilizado. Isso porque a educação científica desenvolve habilidades, define conceitos e conhecimentos, estimula a observação, o questionamento, a investigação e o entendimento, de maneira lógica, sobre os seres vivos, o meio em que vivem e os eventos do nosso dia a dia. Além disso, estimula a curiosidade, a imaginação e a compreensão do processo de construção do conhecimento. Investir na educação científica contribuirá para que os resultados das pesquisas estejam ao alcance de todos. É fundamental, portanto, para que a sociedade possa compreender a importância da ciência no cotidiano. A educação científica também representa o primeiro degrau da formação de recursos humanos para as atividades de pesquisa. É preciso considerar que o analfabetismo científico aumentará as desigualdades, marginalizando e excluindo do mercado de trabalho uma grande parte da população que não tiver acesso a esse tipo de educação.
\”A leitura do mundo precede a leitura da palavra\” – a célebre frase de Paulo Freire aponta a importância da educação científica para as crianças, pois ela provê um conjunto de conhecimentos que facilita a leitura do mundo em que vivem. A visão do mundo é construída a partir da infância, na família, e tem o seu ponto de inflexão na escola. Já há cerca de 800 anos, o frade Roger Bacon (1214-1294), em seu Opus Majus, dizia: \”Sem um experimento nada pode ser conhecido adequadamente. Um argumento prova sob o ponto de vista teórico, mas não leva à necessária certeza para remover todas as dúvidas\”. Diante das novas necessidades da educação em ciências no século XXI, a escola deve ser percebida como tendo um potencial riquíssimo de encontro humano, desperdiçado pela repetição secular de uma pedagogia tradicional. Por meio de uma nova educação científica no ensino fundamental, poderemos mudar esse nível de ensino, preparando jovens que não vão aceitar um ensino médio ou superior de baixa qualidade. Nessa nova pedagogia, a experimentação deverá ser o principal instrumento de estímulo e da aprendizagem da ciência. Os recursos modernos de comunicação, por meio de mídias digitais – vídeos, interação via TV digital, internet etc. – deverão ter um papel importante no ensino de ciências para nossos jovens.
No Brasil, que hoje conta com 48,6 milhões de matrículas no ensino básico, ainda falta muito para que a educação científica tenha seu merecido destaque no currículo escolar. O desafio é criar um sistema educacional que explore a curiosidade das crianças e mantenha a sua motivação para aprender ao longo da vida. As escolas precisam se constituir em ambientes estimulantes e experiências recentes têm despertado o interesse das crianças e jovens pela ciência e pela tecnologia. Um deles é o projeto Mão na Massa, introduzido no país pela Academia Brasileira de Ciências (ABC). A iniciativa faz uso de atividades experimentais, estimulando o desenvolvimento da linguagem oral e escrita e investindo na formação de docentes. Outra experiência de sucesso está sendo conduzida nas cidades de Natal e Macaíba, no Rio Grande do Norte, e em Serrinha, na Bahia. As crianças frequentam uma escola de ciências nos horários opostos ao turno escolar formal. Os ambientes de aprendizagem (laboratórios, oficinas etc.) são desenhados e equipados especialmente para despertar o interesse pela ciência nos estudantes do ensino básico. Tive a oportunidade de visitar esse projeto em Natal e Macaíba. Percorri os vários ambientes de aprendizagem acompanhado pela diretora Dora Montenegro e, em todos eles, procurei dialogar com os educandos. No final eu perguntava: – O que vocês gostam mais, da escola tradicional ou dessa \”escola de ciências\”? As respostas foram unânimes: – Gostamos mais da \”escola de ciências\”. – Por quê?, eu perguntava. As respostas foram profundas e inteligentes: \”aqui somos tratados como gente\”, \”aqui somos bem recebidos\”, \”aqui tudo parece um parque de diversões\”. Destaco a resposta de uma estudante que parecia ter nove anos. \”- Na outra escola eu estudo, aqui eu aprendo\”. Sem necessidade de comentários, falou e disse!
Outra experiência exitosa, que merece destaque e registro, foi a implantação, no século passado, de um projeto voltado ao ensino de ciências, executado pela Fundação Brasileira para o Desenvolvimento de Ensino de Ciência (Funbec) e liderado pelo cientista Isaias Raw. Além da produção de material para o ensino da ciência, a Funbec produzia também equipamentos médico-eletrônicos. O lucro da venda desses equipamentos era revertido para a produção de material didático. Essa iniciativa floresceu na década de 1970, com a introdução de laboratórios portáteis de física, química e biologia, e da coleção \”Cientistas\”, com parceria da editora Abril, que consistia de 50 kits diferentes, contendo a biografia de um cientista, um manual de instrução e material para a realização de experimentos. Nos anos em que o projeto persistiu, foram vendidos cerca de três milhões de kits. A partir de 1980, as atividades foram gradativamente reduzidas. O último suspiro do empreendimento foi a criação da Revista de Ensino de Ciências, hoje extinta. Recentemente, uma iniciativa tenta reabilitar o projeto que teria um novo nome: Aventuras na Ciência.
O Programa de Vocações Científicas (Provoc), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), é outra iniciativa pioneira nesse sentido, implantada há mais de 20 anos e que continua até o presente. O Provoc tem estimulado vocações na área biomédica, em centenas de jovens estudantes do ensino médio, por meio da iniciação científica. Exemplos como esses devem inspirar ações futuras.
Outro projeto inovador de educação científica é o Ciência, Arte & Magia, precedido em 2001 pelo projeto C.I.E.N.C.I.A (Centro de Investigações e Estudos Neofilosóficos de Ciências Avançadas), conduzidos pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). O projeto, que envolve crianças a partir dos 6 anos, já resultou na publicação de vários livros – que compõem a Coleção Novos Construtores – escritos pelos jovens que participaram das atividades. A ideia é desenvolver no estudante a sua criatividade para a realização de experimentos científicos, e capacitar professores para utilizar o material experimental em suas disciplinas específicas. O projeto também busca implementar espaços científico-culturais que se constituam em uma janela para a alfabetização científica, colaborando com o ensino formal das ciências. Além de atender escolas de Salvador, o projeto foi estendido para escolas em Feira de Santana e Seabra, na Chapada Diamantina.
Há 60 anos, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) implantou o programa de iniciação científica, que permite ao estudante universitário de graduação a vivência em um ambiente científico. Hoje esse programa tem a participação de cerca de 100 mil estudantes universitários em todo o Brasil, dos quais aproximadamente 60 mil são contemplados com bolsas de auxílio por meio do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic). Em 2004, o CNPq lançou o Programa de Iniciação Científica Junior (Pibic-Jr), nos moldes do programa já existente, que permite o treinamento científico de estudantes do ensino médio e profissional. Esse programa tem atualmente 10 mil bolsistas. Posteriormente, o CNPq lançou o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Pibit), que conta atualmente com cerca de quatro mil bolsas. Devemos louvar essas iniciativas virtuosas.
Temos notáveis iniciativas no ensino de ciências e na educação científica no país. Atrair e estimular talentos para termos uma massa crítica de recursos humanos para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil é uma missão do presente que garantirá um futuro virtuoso para as próximas gerações de brasileiros. O ensino de qualidade, especialmente no nível fundamental, que é o nível que mais afeta a cidadania, deve ser visto como um compromisso de todo o país, em todas as suas instâncias e segmentos. Para uma sociedade democrática, que tem como pressuposto o oferecimento de oportunidades iguais para todos, trata-se de uma missão fundamental.
* Professor emérito da Universidade de Brasília (UnB) e da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), pesquisador emérito do CNPq, membro do Núcleo de Estudos do Futuro da UnB e dirigente do \”Movimento 2022 – o Brasil que queremos\”